Resistência e a velha História do Brasil
É clássica a interpretação da historiografia tradicional do povo Brasileiro como um povo pacífico e a citação do Quilombo dos Palmares como único momento de resistência à escravidão, além dos movimentos abolicionistas. Pelo menos no que se ensina no ensino médio, o normal são poucas referências a algo além da Inconfidência Mineira como exemplos de revolta no Brasil.
Alguns livros didáticos até citam a Conjuração Baiana, poucos citam a Revolta dos Malês. A maioria fica na inconfidência mineira, como resistência à opressão e no Quilombo dos Palmares, como resistência à escravidão. Inclusive, a redação destes livros de certa forma hierarquiza estas lutas, colocando o ensaio geral de conspiração de elite que foi a Inconfidência como mais importante que o maior Quilombo de que se tem notícia nas Américas e , com certeza, a mais duradoura experiência de resistência ocorrida no País como menos importante.
Qualquer referência às 2.228 comunidades quilombolas espalhadas por todas as regiões do país conforme levantamento do Centro de Cartografia Aplicada e Informação Geográfica (Ciga) da Universidade de Brasília (UnB) e aos quilombos que lhes deu origem é uma utopia, dado que resistência no Brasil não existe. Só se for à famigerada coroa Portuguesa e por um clube conspirador da elite de Vila Rica.
A Revolta dos Malês, a maior revolta Negra do Brasil e a primeira de caráter classista no Brasil, composta por negros livres e escravos e apoiada pela base da população baiana do Período (1835), é quase sempre solenemente ignorada, a Cabanagem idem.
Todas estas revoltas possuem algo em comum, foram feitas majoritariamente por negros, índios e quilombolas.
Inúmeros quilombos se espalharam pelo Brasil, a maioria deles de resistência, com a busca de construção de um sistema próprio, autônomo, de organização, que era nitidamente de rompimento com o sistema da Colônia. Revoltas escravas ocorriam a todo o momento no Brasil. Só na Bahia foram mais de 50 revoltas escravas de 1798 até 1835, sendo a mais importante a Revolta dos Malês. O Recôncavo Bahiano era um imenso barril de pólvora e por diversas vezes o Governo da Bahia à época tinha de pedir reforços e auxílio à Corte para controlá-las.
Porém, como o aluno de ensino básico e ensino médio tem acesso a isso? Onde?
Simplesmente não têm. E quando têm, as referências são tímidas, como desimportantes, dado o imenso esforço de manter a idéia de uma população servil, pacífica, principalmente os negros e índios.
Este fato demonstra mais do que uma busca de manutenção de um quadro onde a população se veja como impotente ante a constante opressão de que é vítima. Demonstra também que o esforço vai além, no sentido de demonstrar que a população é pacífica, mas em especial os mais oprimidos, os negros e índios, e que estes mais ainda, nunca se rebelaram contra a situação a que foram submetidos.
Para que referir-se ao pânico da elite baiana em 1835 com relação à possibilidade de um novo Haiti no Brasil e ao movimento que aumentou em muito este pânico e exigiu um controle no envio de escravos com origem na Nigéria e Benin ao Brasil? Nunca. Para que dar idéias a um povo acostumado à chibata?
É preciso que a população tenha consciência da Revolta da Chibata, da Revolta dos Malês, dos inúmeros Quilombos que resistiram à opressão e buscaram liberdade e autonomia e para isso é preciso lutar pela construção de um ensino que respeite a História deste povo, principalmente o exemplo dos que resistiram mesmo sendo os mais oprimidos de todos. É preciso que lutemos para que todos os Palmares sejam conhecidos, para, quem sabe, criarmos Novos Palmares.
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