quinta-feira, junho 19, 2003

Observações sobre um mesmo velho mundo




Eu comecei a escrever tentando falar de guerra, mas as palavras pareciam indicar algo mais, um assunto maior. Pensei em escrever sobre ecologia, capitalismo, anarquismo e uma infinidade de assuntos que me calavam, apontando para algo mais, algo mais importante.

E o assunto me impede até de me emocionar, sentir orgulho, perceber um mundo melhor à minha volta, entender o todo sem que ao menos um sentimento ruim me invada. E olha que eu nunca fui um defensor da idéia muitas vezes divulgada da impossibilidade de equilíbrio neste mundo.

É, o texto é sobre o papel do homem no mundo.

Não quero ser piegas ou defender os argumentos tolos que colocam o homem como um câncer da natureza, um vírus. Tampouco desejo esconder meu orgulho com a existência de Gandhi, Martin Luther King, Jesus, Buda, Pelé, Picasso, Francis Bacon, Karl Marx, Kaines, Adam Smith, Branco, Zico, Robinho, Luis Fernando Veríssimo e tantos outros que me impossibilitam uma lista completa das mentes que fizeram nascer um orgulho de ser humano. Mas como algum dos gênios do mundo um dia disse que os idiotas dominariam o mundo, estou mais do que irritado com a extrema imbecilidade que a raça humana pode cometer mais cedo ou mais tarde.

A guerra EUA X Iraque é de uma estupidez tamanha que qualquer argumento diferente desse, seja pró ou contra, é inútil na sua definição. Mas não é isso que mais me irrita.

O problema da dominação, cada vez maior, das grandes corporações dos cenários políticos e econômicos do mundo, destruindo áreas cada vez maiores, lençóis subterrâneos de água mineral, reservas de petróleo, mares, rios, florestas, e, quando responsabilizadas, utilizando artifícios juridicamente, no mínimo, vis para ganhar tempo, ridicularizando o sistema judiciário deste e de outros países. Nem isso, porém me irrita tanto.


A grande cara de pau de forças políticas que, em nome de um ganho cada vez maior de poder, se digladiam ao invés de buscar a resolução dos problemas que afligem nossa população também quase me fazem caminhar na direção de acreditar que o homem é um câncer, uma besteira de Deus, um lixo, mas nem isso consegue me tirar do sério.

O que me tira do sério é a imensa omissão que a população do mundo, em grande maioria, se coloca, na sua passividade de gado, na sua idéia de vida como um grande nada a fazer, pois o destino escolhe nosso caminho. O que me tira do sério é olhar nas ruas e ver que as pessoas estão mesmo é querendo um barranco para encostar sua existência medíocre, suas vidas de casa de bonecas, suas vidas inúteis. Quando isso me acontece, quando percebo o comportamento de gado de grande maioria da população, quando vejo que a vida deles é inútil para eles, eu quase, aí sim, caio no argumento de que o ser humano é um vírus, mas um vírus tolo e covarde que merece o extermínio por si só.

Essa covardia, que em sua manifestação permite que quem possui o poder passe por cima de todos, passe por cima dos que sonham com um mundo melhor e lutam, passe por cima da ética e da busca pelo equilíbrio, não é culpa do capitalismo, socialismo, anarquismo, religiões, nada disso. A culpa é de nossa imensa covardia no encarar a vida como um desafio constante e necessário para o crescimento de nosso poder, de nossa existência, coisa que uns chamam de evolução e outros de vencer a cadeia de predação, outros dizem que é manifestar os deuses em nós, mas inevitavelmente todas as filosofias, religiões, idéias políticas, informam que é necessário coragem, sabedoria, entre outras coisas para se crescer e viver. Mas o que se percebe, no dia a dia, é que a covardia é a escolha desse mundo, a covardia que permite que toda a decisão do mais forte se realize e que voltemos à idéia natural de sermos ovelhas dos leões.

Eu digo não a isso. Eu não quero ser pasto de reis ou sacerdotes que me tirem a possibilidade de ser o que a minha vida quer, o que meu ser grita. Eu não nasci para ser pasto de idiotas, membro do gado, prefiro ser destruído pelo mais forte a ajoelhar a sua frente.

Morrer é um preço muito pequeno em relação à liberdade, morrer é necessário, cada vez mais, para que nos tornemos maiores, deixando nossas velhas peles mortas no caminho.

E o risco não precisa colocar o rosto em frente a um canhão, mas colocar a alma e dizer alto, não. Não à guerra, não à ignorância, à estupidez. Não a essa acomodação que destrói o orgulho que minha espécie me fez sentir desde a primeira vez que eu pisei este mundo. Orgulho de ver uma espécie que vivia como gravetos tornar-se uma espécie forte como um carvalho.
E para que essa força? Para que sejamos ovelhinhas de propriedade de um senhor? Ou para crescermos juntos, cada vez mais e fazermos um mundo decente, com respeito a ele, um mundo onde a terra e o semelhante sejam respeitados? Prefiro a segunda opção, porque respeitar o semelhante exige uma coragem superior è coragem de apontar uma arma para ele. Respeitar o semelhante é uma exigência, pois respeitar o semelhante é respeitar a terra ao redor, é respeitar o mundo que nos permitiu a arma da inteligência para que vivêssemos, nos tirou das mandíbulas dos predadores , mas nunca para nos colocar nas mandíbulas dos generais.

Se a humanidade em sua maioria prefere calar-se e viver à sombra dos imbecis o mundo saberá, sim, responder, eu prefiro estar ao lado dele, assim pelo menos não terei a vergonha de mugir nas estradas.

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