quinta-feira, dezembro 26, 2002

Fonte: Terceira Base


A Coluna do publicitario Lula Vieira (V&S Comunicacoes),
achei que valia a pena reproduzir aqui...

Coluna publicada semanalmente,
no caderno Propaganda e Marketing.


OUTRA DO TICO




Voce se lembra que eu lhe contei aquela entrevista que
demos (Ze Rodrix e eu) para o programa da TV Cultura,
onde ouvi a historinha do Tico mandando o presidente da
Nestle a merda? Bem, nao foi bem isso, claro. O Tico
fingiu que mandou o presidente da Nestle a merda. Mas
impressionou paca um jovem trainee que estava enchendo
o saco. Pois o Ze me contou outra aventura do Tico,
digna de registro. Um dia toca o telefone e um diretor
de comerciais comunica ao Tico que acabara de brigar
com um cliente importantissimo da produtora. Bem, o
tal diretor, no auge da ira, mandou o cliente fazer
algo bastante indigno com a conta. Aquelas besteiras
que em nome do, sei la do que, a gente faz uma ou outra
vez na vida e se arrepende seculos. Como dizia um filosofo
publicitario amigo meu: "Eh melhor amarelar de vez em
quando do que passar a vida toda no vermelho". Covarde,
mas infinitamente sabio. Continuando. O Tico se prepara
para o pior. O tal cliente representava uma parcela
importante do faturamento da casa. Voltar atras poderia
ficar feio. Desautorizar o diretor pegaria mal junto ao
pessoal, que sempre espera de nos, empresarios, uma
atitude de macho, geralmente incompativel com nosso
profundo amor ao dinheiro. Ou, para sermos menos cinicos,
a nocao de que as contas precisam ser pagas. E que conta
paga-se com dinheiro. Duvida cruel: como sair da situacao
com um minimo de dignidade? Em ultimo caso, como sair
da situacao? Tico ficou cogitando diversas hipoteses e
se sentindo cada vez pior. Alias, um parenteses: voces
ja ouviram politico dizer que nao raciocina sobre
hipoteses? Eh o que mais tem. Pois se nao raciocina
sobre hipoteses, raciocina sobre o que, o filho da
puta? Chega de parenteses, Lula! Nessa hora toca o
telefone e a secretaria anuncia: "Tico - o tal cliente!"
Calou-se a Voz do Brasil (para quem nao sabe, Voz do
Brasil eh o nome da produtora). Tico atende o telefone
e fica ouvindo em silencio. Facil imaginar que do outro
lado o cliente narrava o ocorrido. A expectativa era geral.
O ar, pesado. Todo mundo pensando no proprio emprego.
Tico ouvindo. Dava ate para perceber no som metalico que
vazava do fone que a narrativa era enfatica. Mais ainda.
Puto da vida. Tico respira fundo e interrompe o cliente:
- Fulano ja ouvi tudo. Ja entendi. Sabe o que acho disso?
Eu acho o seguinte: voce pega essa sua conta, voce pega seu
faturamento, voce pega seus dez comerciais por mes e...
(Meu Deus todo mundo pensou - ele ficou louco! Naqueles
segundos que antecederam o fim da frase, cada um dos socios
e funcionarios viu sua vida como num filme - tal qual os
afogados sentem - e quase entraram em panico. A voz do
Tico cresceu e seu grito ecoou pela casa inteira)
- ... enfia no meu cu! Fez-se um enorme silencio, pleno
de expectativas. Pelo fio, primeiro timido, depois em
cascatas de alivio, a gargalhada do cliente. Por pouco
Tico nao foi carregado em triunfo.

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