terça-feira, abril 08, 2003

Falamndo de mais um problema, o prefeito, a gente consegue falar mais do problema das águas da Nestlé. Fonte: Movimento Cidadania pelas águas.

Ameaça das águas assusta Nestlé



A comunidade sanlourenciana tem tomado posição firme em defesa das águas,
até mesmo porque o prefeito municipal é totalmente omisso


Valéria Fernandes, de São Lourenço



Depois de três anos de exposição na mídia, vítima de denúncias sobre ameaças ao meio ambiente com a exploração comercial abusiva das águas minerais de São Lourenço (MG), por meio de sua subsidiária Perrier Vittel, dona da Empresa de Águas São Lourenço, a Nestlé, vencida pelas manifestações populares, decidiu entrar oficialmente no jogo para resguardar sua imagem. No mês passado convidou prefeito, políticos, empresários, representantes da comunidade e imprensa para mostrar as instalações da fábrica e esclarecer dúvidas sobre sua atuação no município. Basicamente, a defesa da empresa se resume na frase: "Exploramos menos do que o DNPM nos permite". Embora as explicações não tenham convencido boa parte de moradores, empresários, turistas e ambientalistas, ao aceitar discutir o assunto, a multinacional suíça começou um trabalho de aproximação com a comunidade. O resultado prático das primeiras reuniões é a formação de uma comissão com representantes dos diversos setores da sociedade para revitalizar o Parque das Águas, a principal atração turística da cidade.



Para o vereador Cássio Mendes, um dos líderes do movimento Cidadania pelas Águas, que contesta a atuação da multinacional, "a Nestlé marcou um golaço" com as reuniões. Na opinião de Cássio, o fato novo prejudica o movimento que já recolheu quase seis mil assinaturas e levou o promotor público da cidade a abrir um processo contra a empresa. Segundo o vereador, por falta de informação mais detalhada, muitas pessoas ficaram satisfeitas com as explicações e impressionadas com as instalações da Nestlé. Pessoalmente, o vereador, que redigiu o relatório final do trabalho levantado pela Comissão Especial para Estudo e Defesa das Águas Minerais, da Câmara Municipal, acha que, ao abrir as portas da fábrica, "a Nestlé levou as pessoas para ver o crime que eles estão cometendo".


Já os empresários consideraram a aproximação da empresa positiva. "Foi o ponto de partida para melhorar o relacionamento com a comunidade", disse José Neto, coronel reformado do Exército, hoteleiro e um dos líderes do movimento Viva São Lourenço Viva. Para ele, a exposição dos problemas das águas de São Lourenço na mídia foi negativa para a economia da cidade. A melhora nas relações, no entanto, não acaba com o problema. Mas, ao contrário do movimento popular Cidadania pelas Águas, o movimento Viva São Lourenço Viva, prefere lutar em defesa das águas de São Lourenço de maneira mais discreta. Segundo José Neto, os empresários estão trabalhando junto a políticos para aprovar mudanças no Código das Águas Minerais. "O código atual tem quase 60 anos. Ele precisa ser revisto à luz das questões ambientais, sociais e tecnológicas levantadas nesse novo milênio", diz José Neto.
FHC e a água mineral. O trabalho, também apoiado pela ONG Cidadania pelas Águas, está dando resultado. Em maio deste ano, o presidente Fernando Henrique assinou um decreto criando uma comissão para estudar a revisão do Código de Águas.


De qualquer forma, resposta da Nestlé era cobrada por todos os segmentos da comunidade e pelos turistas, interessados em preservar a tradição da estância hidromineral. O próprio gerente de Comunicação da multinacional, Francisco Garcia, reconheceu que a resposta demorou. "A população devia pensar: quando é que vem a cavalaria (a Nestlé) para salvar a Empresa de Águas?".



Cavalaria


Bom, a cavalaria chegou quase quatro anos depois de começar as primeiras batalhas, com a mudança de toda a diretoria da subsidiária Perrier Vittel do Brasil. No início deste ano, Fúlvio Giambelli assumiu a presidência da Divisão de Águas da Nestlé no Brasil e começou a trabalhar esta campanha de esclarecimento. A simpatia com que todos foram recebidos pela multinacional não foi suficiente para esclarecer todas as dúvidas.


As instalações do parque industrial impressionam. Não é para menos, desde que assumiu a empresa, em 1992, o grupo investiu US$ 25 milhões na modernização da fábrica. Os investimentos estão dando de retorno um crescimento de 10% a 15% ao ano. Segundo Giambelli, no ano passado a Divisão de Águas da Nestlé brasileira faturou cerca de R$ 65 milhões, sendo que a fábrica de São Lourenço foi responsável por 50% deste faturamento.



Expansão


Com as reformas, o parque industrial da Empresa de Águas aumentou consideravelmente sua área. Além da automatização do engarrafamento, ganhou uma fábrica de garrafas PET, e uma sofisticada usina para desmineralizar uma das águas encontradas no parque. Foi com essa expansão que os problemas começara a aparecer.


Até 1992, as águas gasosas de São Lourenço, com propriedades medicinais comprovadas, eram exploradas praticamente sem interferência de máquinas. Na área do parque brotavam as fontes Vichy, sulfurosa, alcalina, carbo-gasosa, ferruginosa, Oriente e magnesiana.


A primeira captação da fonte Oriente foi feita em 1892, justamente 100 anos antes da Nestlé assumir o Parque de São Lourenço. Naquela época, apenas as águas das fontes Oriente e magnesiana eram exploradas comercialmente e engarrafadas.



O milagre das águas medicinais de São Lourenço


O prefeito de São Lourenço, Clóvis Aparecido, não participou dos debates dos movimentos de cidadania

Quando a Nestlé assumiu a empresa, em 1992, já não se engarrafava mais a magnesiana, porque a fonte apresentava problemas de captação. A água foi diminuindo e acabou desaparecendo totalmente em 1997.


Segundo a empresa, a fonte não secou, apenas está difícil fazer a recaptação. Este ano, a empresa decidiu fazer a elevação do nível dos lagos, próximos a fonte, com o objetivo de provocar a expulsão natural em um dos seus antigos pontos de captação. Mas o presidente da empresa, Fúlvio Giambelli, admite que a fonte pode brotar em outro lugar e com características totalmente diferentes.
Um antigo funcionário da empresa afirma que a magnesiana realmente tem um problema de captação, mas garantiu que "a vazão sempre foi inferior a demanda". O mesmo funcionário disse não entender como a Nestlé consegue engarrafar tanta água da fonte Oriente.



Omissão do prefeito



Fica claro que a Nestlé, por meio da Empresa de Águas, tem um papel vital na economia da cidade e da região. Mas o prefeito do município, Clóvis Aparecido Nogueira, tem pautado pela total omissão. Não fala nada sobre o assunto. Nem se posiciona oficialmente. Não participa dos debates e nem apoia os movimentos de cidadania. Parece que a discussão não envolve os interesses do município. O que chamou mais ainda a atenção, foi o fato do prefeito Clóvis Aparecido não comparecer a nenhumza das manifestações públicas, mas fez questão de prestigiar a festiva visita à fábrica da Nestlé.




As águas...



Fonte Oriente - Fluoretada litinada carbogasosa (diurética, digestiva e desintoxicante)
Fonte Andrade Figueira - Magnesiana (afecções hepáticas e vesiculares)
Fonte Vichy - Alcalina (úlceras, nefrites e gota)
Fonte Primavera - Ferruginosa (anorexia, anemia e astenia)
Fonte Sulfurosa - (laxativa, diabetes, alergias e coliltes




... e a griffe


A revista VIP de setembro, na seção BOA VIDA,
página 34, faz o ranking das dez melhores águas mineirais do mundo. Em matéria assinada
por Gabriella Galvão, a VIP convidou os sommeliers Ângelo Fornara, Carina Cooper e Joaquim Neto para degustarem, às cegas, as águas minerais gasosas encontradas nas grandes lojas de São Paulo.


Primeiro lugar:São Lourenço.




O RANKING


1 - São Lourenço - MG
2 - Petrópolis Paulista - SP
3 - Minalba Classic - SP
4 - Crystal - SP
5 - Highland Spring (Escócia)
6 - Perrier (França)
7 - Lambari - MG
8 - San Pellegrino (Itália)
9 - Great Value (SP) (nas duas últimas houve empate técnico)
9 - Schincariol (SP)





Faltou sensibilidade à Nestlé


A Perrier, antiga proprietária da Empresa de Águas São Lourenço, já tinha um distanciamento
com a comunidade. Esse distanciamento aumentou quando a Nestlé internacional assumiu,
há 10 anos, a Perrier internacional e ficou com o Parque de São Lourenço.



A preocupação única com o lucro e com a exploração das águas, colaborou fundamentalmente para a organização dos movimentos de cidadania e de conscientização da população, iniciando uma série de protestos contra a Nestlé.


O quase descaso com o Parque das Águas gerou sérias "antipatias" dentro e fora da comunidade. A verdade é que a empresa por só pensar nos lucros, se sente incomodada pelo fato de administrar a principal atração turística da cidade.


O argumento, repetido nas reuniões pelo presidente da Divisão de Águas, Fúlvio Giambelli, é que o grupo não tem competência para atuar no segmento de turismo.


Essa falta de competência quase reduziu o horário de funcionamento do parque, no início dos anos 90. A empresa alegava estar gastando muito com a folha de pagamento dos funcionários. Quem ficar de costas para o Parque das Águas, está também de costas para o município, para seus habitantes e para os turistas, lembra um professor de Turismo e Hotelaria da Faculdade Santa Marta.
Os empresários, comerciantes e hoteleiros tiveram que intervir duas vezes para que o parque não fosse fechado. O parque é fundamental para atrair turistas, movimentar o comércio e lotar os mais de 50 hotéis da cidade. Ele é tão fundamental quanto a irrisória receita gerada ao município pela industrialização das milagrosas águas: apenas R$ 250 mil por ano.


Uma receita que a partir do ano que vem deve aumentar para apenas R$ 700 mil, pois acabam as isenções obtidas para a importação de sofisticados equipamentos. Acredite se quiser: foi dada até isenção fiscal para que a Nestlé fizesse a super exploração das águas minerais.



Superexploração das águas


A Magnesiana tinha desaparecido e a fábrica já estava em pleno funcionamento, quando, em 1999, um estudo, encomendado a Comissão de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM) pela prefeitura de Caxambu sobre a situação do aquífero do sul de Minas constatou "a queda de vazão nas fontes, provávelmente em decorrência a super exploração". No mesmo ano, um relatório de avaliação pedido pelo DNPM, órgão que normatiza e fiscaliza a exploração das águas, confirmava: "As alterações hidrodinâmicas e hidroquímicas encontradas em São Lourenço são devidas a super exploração".


A Nestlé se defende, argumentando que explora menos que o DNPM autoriza. Do volume permitido, 222 milhões de litros por ano, a Nestlé só extrai 49 milhões, 22%. Mas o movimento Cidadania pelas Águas contesta não apenas a quantidade, mas a forma de exploração.


A vilã da alteração do sabor e das quantidades das águas do parque é a fonte Primavera, descoberta em 1996 e engarrafada a partir de 1997 com o nome Pure Life. Foi para ela que a empresa construiu a sofisticada usina de desmineralização. Até então, os sistemas de bombeamento usados para captar as águas das fontes não ultrapassavam os 12 metros de profundidade. Para retirar a água da fonte Primavera, a empresa bombeia a uma profundidade de 150 metros. Isso, na avaliação dos ambientalistas, interfere no subsolo e em todas as outras fontes.


Baseado no relatório da Câmara dos Vereadores, que anexa pareceres de geólogos e técnicos do CPRM, o Ministério Público de São Lourenço está contestando a exploração feita pela Nestlé. Nos próximos dias, o perito nomeado pela Justiça, Aldo Rebouças, fará a prova pericial solicitada pelas duas partes envolvidas no processo.

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