domingo, abril 13, 2003

Fonte:

Entrevista com Marcelo Baglione





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Marcelo Baglione é carioca, publicitário, escritor e cronista ambiental, e já vem atuando há alguns anos em vários portais da web, apresentando importantes pautas do jornalismo ambiental. Nesta entrevista ao Planeta Orgânico, Marcelo propõe uma "reforma azul", lembrando nossa responsabilidade como "molas propulsoras" desta mudança.

PO- O que a sociedade brasileira pode e deve fazer para garantir a manutenção da qualidade da água?

MB- Sentir-se cidadão, brasileiro, dono desta terra e, portanto, co-responsável pela gestão e o manejo consciente e solidario de nossos recurso hídricos. Acho que precisamos ter uma relação equilibrada com a água, da mesma forma que passamos a ter com a energia elétrica. A sociedade deve lutar pelas águas da mesma forma que um trabalhador reivindica salários e condições sociais mais justas. Tudo isso é uma questão de educação; deve começar nas escolas e principalmente no seio próprias famílias.

PO- Técnicos da ONU vem alertando para o grave problema da escassez da água, que deverá se acentuar nas próximas décadas. O Brasil tem as maiores reservas mundiais de água doce. Que atitudes o governo brasileiro deveria tomar para garantir este patrimônio precioso?

MB- No atual estágio da política brasileira, temo muito pela atitude e posturas de nossos desgovernos, em vários níveis. Vejo os atuais políticos como fruto do clientelismo colonial quinhentista que só gera ações anti-solidárias; portanto, absolutamente contra os cidadãos desta riquíssima terra. Raros devem ser os homens públicos que tem uma percepção macro polítca para compreenderem o quanto nossas reservas hídricas serão importantes num perspectiva planetária dentro em breve. Em parte devemos esperar do governo, mas em grande parte devemos ser as molas propulsoras desta "reforma — azul! — de conscientização hídrica no Brasil".

PO- Dizem que a água é a "commodity" deste milênio.Você concorda? Por que?

Commodity simplesmente, não! "Commodity Ambiental", como concebeu a mentora desta idéia, a economista Amyra El Khalili, coordenadora de Rede Internacional de Comunicação CTA-JMA. A água, o sangue de Gaia, o ouro azul que mamãe Oxum tornou mais abundante no Brasil do que o petróleo no Oriente Médio, não pode ser tratada como uma simples mercadoria e depois prostituída, através dos cafetões da velha ordem, através de uma atitude econômica perversa que não vê nada além de lucros. Para estes, o princípio de humanidade passou longe...Chega de miséria socioambiental! Antes de tudo, este milênio será um ciclo do reerguimento do feminino (da anima) numa escala global. Lutar pela água e por um mundo ecologicamente sustentável e fazer nossa humanidade se reencontrar com o feminino, seja individual ou coletivamente. Commodity ambiental de uma lado, sim, mas com uma reestruturação coletiva dos princípios cosmo-ontobiosféricos, também.

PO- Grandes empresas como a Nestlé estão comprando água em todo o mundo.Como você vê esta "privatização" da água?

MB- Quem ler o "Dossiê Nestlé A Teoria da Conspiração Movimento Cidadania pelas Águas", certamente ficará bastante preocupado com duas coisas: a água em si, e a nossa cidadania biosférica. Nunca é demais perguntar: onde a tua soberania foi parar? Onde foram parar os direitos sobre as riquezas do Brasil e dos cidadãos de São Lourenço que foram lesados nesta história pela multinacional Nestlé, que explora as águas desta região? Minha certeza, é a minha esperança: estamos ingressando num ciclo mundial onde não haverá mais espaços para um "John Davison Rockefeller das águas". A questão é grave, pois toca no princípio de soberania e cidadania biosféricas; além disso, também somos os detentores das maiores reservas de água mineral. Somos filhos de índios, portanto, devemos apelar para nossas raízes arquetípicas: nesta história, sejamos fortes como um cacique, mas sábios e profundos como pajés.
O que é o Aqüífero Guarani ?

De uns tempos para cá, andei me informando sobre esse tema e fiquei profundamente comovido com tal riqueza. O Aqüífero Guarani é a maior reserva subterrânea de água doce do mundo. Está localizado no Cone Sul e abrange os territórios da Argentina, Uruguai, Paraguai e Brasil, sendo que 71% da superfície deste aqüífero abarca oito estados brasileiros. Como se não bastasse o nosso inigualável patrimônio biogenético, ainda fomos agraciados pela Mãe-Terra com um potencial hídrico invejável, do qual o Gigante do Guarani é mais um destaque. Sugiro a todos a leitura de uma matéria que fiz para o Informática/JB, onde disponibilizei vários links sobre o assunto: um tema que realça, e muito, a importância geopolítica desta região para os anos vindouros. Pense nisso, pois é uma noção fundamental de conscientização ecológica transfronteiriça, um passo essencial, portanto, para a fundamentação de uma cidadania, global, biosférica.

Link: http://jbonline.terra.com.br/jb/papel/cadernos/internet/2002/03/06/jorinf20020306007.htm

PO- Fale sobre o Programa de Educação Ambiental para a Baía de Guanabara e a proposta dos Protetores da Vida.

MB - Em 2001, durante o primeiro e segundo semestres, tive a oportunidade trabalhar como coordenador de comunicação e conteúdo deste expressivo programa de educação ambiental. Executado no Estado do Rio de Janeiro pela Ong CIMA — Centro de Cultura, Informação e Meio Ambiente —, o projeto Protetores da Vida Baía de Guanabra www.protetoresdavida.org.br é uma semente inédita de conscientização, luta e recuperação deste rico e importante símbolo histórico e ambiental de todos os brasileiros. Sua marca: o trabalho e toda a problemática socioambiental que assolam a Baía foram efetuados não de uma forma isolada, mas em torno da Bacia Hidrográfica da Baía de Guanabara. Logo, foi essencial para o desenvolvimento e o conseqüente processo de conscientização ambiental das populações que atuaram neste projeto, a compreensão sobre o conceito de bacia hidrográfica, um princípio fundamental para a defesa da vida e da qualidade de nossas águas.


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