terça-feira, abril 15, 2003

Fonte: No Mínimo

A polêmica dos pontos corridos



Leo Jaime


14.Abr.2003 | O campeonato brasileiro começou e os pontos já estão correndo. Campeonato longo esse. Essa é a principal justificativa para que a fórmula dos pontos corridos seja a escolhida por grande parte da mídia e até dos clubes envolvidos no evento. Diferente de um torneio em que um time que está vivendo um bom momento supera um outro de melhor retrospecto, o campeonato por pontos corridos quer premiar o melhor elenco, a melhor trajetória, sem o improviso do destino a mudar coroas de lugar. Sem surpresas e sem injustiças. Aí é que reside o problema. Como diz um amigo: futebol é sobretudo injustiça.

O futebol é interessante em muitos aspectos, evidente, mas nada é mais charmoso do que a possibilidade do pequeno bater no grande, do baixinho superar o gigante, do pobre vencer o rico. No futebol isso acontece o tempo todo e torna a coisa mais apaixonante e democrática. Concordo com os que advogam o campeonato por pontos corridos, ou melhor, com os que defendem um campeonato longo sem os mata-matas típicos de um torneio. Campeonato é uma coisa e torneio é outra. Copa do Mundo é torneio. Um mês. Quem estiver bem naquele mês leva. Campeonatos precisam de tempo, de idas e vindas, de elenco mais que time, de regularidade e tudo o mais. Porém, há que se dar ouvidos também aos que são contra e, entre eles, vários jogadores. Mas quais seriam os possíveis problemas do campeonato que agora se inicia, depois de tanta luta por esse formato?

Vamos supor que na vigésima-quinta rodada um dos times tenha conseguido 20 vitórias e cinco empates e tenha, portanto, 65 pontos. Pode acontecer. E o segundo lugar tenha, digamos, 44 pontos conseguidos em 12 vitórias e 8 empates. Também bastante razoável. Como é que ficariam as bilheterias dos times que estivessem abaixo do terceiro colocado? Natural que o time que estivesse disparado na frente enchesse os estádios, mas, e os outros? Claro que no modelo antigo a maioria dos times ficava de férias antes do fim do ano, fora da etapa decisiva reservada aos 8 finalistas. E isso era problema. O fato de que esses mesmos times possam estar jogando para cumprir tabela desde agosto é mais problemático. E pode acontecer.

Outra questão perigosa para os times de grande torcida é o fato de que quando eles viajam para jogar com times de menor expressão os estádios são lotados, no percurso inverso o estádio fica às moscas. Pois se o time grande já está embananado no meio do campeonato pode correr o risco de não ter bilheterias em casa e ter que jogar no prejuízo até o fim do ano, já que as bilheterias fora de casa são do time local. Quem tem elenco caro, uma necessidade numa competição deste estilo, deve estar bastante preocupado. Alguns resultados desastrosos em início de temporada podem afundar o clube. O que também obriga os times a encararem cada partida como uma decisão desde a primeira rodada, mesmo que a torcida não veja as coisas dessa forma.

Qual seria, então, a forma ideal? Falta a grande decisão? Pode acontecer o que houve na Fórmula 1 o ano passado, quando o campeonato estava decidido 6 rodadas antes? Sim, pode. E se a Fórmula 1 mudou para evitar isso, os opositores ao modelo de pontos corridos merecem ser ouvidos. A Fórmula 1 está muito mais interessante na temporada 2003. É uma experiência, esse formato de campeonato, aqui no Brasil embora seja uma realidade em países europeus. No entanto é bom lembrar que Barcelona e Inter de Milão vendem seus carnês com os ingressos para todos os jogos antes do campeonato começar. A grana de televisão é outra, a dos patrocínios também e, ainda assim, os clubes dão seus mergulhos no vermelho. É um risco. Agravado pelo fato de que, no Brasil, a cada ano, a cada temporada, é uma nova regra, um novo modelo, uma nova competição. Futebol, além de injustiça, é sobretudo tradição!

Antes que me acusem de estar em cima do muro, quero dizer que sou a favor do atual campeonato. Mas já proponho uma outra fórmula para o ano que vem, se esta não colar. Pontos corridos em dois turnos, um de ida e outro de volta, repetindo as mesmas partidas. O vencedor do primeiro turno joga com o vencedor do segundo. Caso haja um time que tenha conseguido mais pontos do que os vencedores dos turnos, ao longo do campeonato, ele participa da decisão que, no caso, seria disputada entre 3 times. Simples e efetivo. Um detalhe: o vencedor do primeiro turno entra com 5 pontos de bônus no segundo. Emoção garantida em todas as rodadas e a grande decisão, que é o evento dramático que nossas torcidas desejam e glorificam. Ou várias decisões. Mas vou torcer para que o campeonato de 2003 faça jus ao excelente momento por que passa o nosso futebol e seja inesquecível. Assim como suas regras.


leojaime@rio.com.br

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